quinta-feira, 31 de março de 2011

Moderar as Expectativas

Ordinário desaire de tudo o que é muito celebrado antes é não chegar depois ao excesso do que foi concebido. Nunca o verdadeiro pôde alcançar o imaginado, porque fingir perfeições é fácil; difícil é consegui-las. Casa-se a imagi­nação com o desejo e concebe sempre muito mais do que as coisas são. Por maiores que sejam as excelências, não bastam para satisfazer o conceito, e, se o enganam com exorbitante expectação, é mais rápido o desengano que a admiração. A esperança é grande falsificadora da verdade: que a cordura a corrija, fazendo que a fruição seja superior ao desejo. Princípios de crédito servem para despertar a curiosidade, não para empenhar o obje­cto. Melhor resulta quando a realidade excede o conceito e é mais do que se acreditou. Essa regra faltará no que é mau, pois ajuda-o a própria exageração; desmente-a o aplauso, chegando a parecer tolerável o que se temeu ser ruim ao extremo.

Baltasar Gracián y Morales, in 'A Arte da Prudência'

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Será que em tantas milhas não tropeço em nada interessante?
Dizem que não há assuntos desinteressantes, só pessoas desinteressadas. Estarei eu já assim tão desinteressada ou já são para mim todas as pessoas simplesmente desinteressantes?
Looking for some hope again.

quinta-feira, 30 de abril de 2009

Daqui para algures


E se um dia voltares, desse teu mundo a milhas de distância...

E se um dia me quiseres reencontrar... Estarei já perdida no tempo, nas páginas que saltaste sem desfolhar...

Porque quando regressares ao sítio onde me deixaste não me encontrarás mais. Não a pessoa que amaste. Não aquela que te amou.
Mas uma outra. Diferente. Crescida no seu coração. Esquecida das tuas mágoas. Adormecida pelo veneno da diáspora da tua ausência.

Se e quando voltares, não mais serei eu que encontrarás... Um outro eu. Um novo eu. Estilhaçado, restaurado, viajado, caído e levantado. Um eu com milhas de sentimentos percorridos no fio da espada do tempo... Esse tempo que cura... Esse tempo que afasta e que... Inevitavelmente... Nos afastará.

Rezo que voltes antes que eu parta, antes que tu próprio deixes de ser quem amo, quem quero, quem seduzi.

Perdido no tempo e no espaço um sentimento que nos escorre entre os dedos...

segunda-feira, 20 de abril de 2009

A Inutilidade do Viajar

E, nas milhas que faço, é isto que sinto...

Que utilidade pode ter, para quem quer que seja, o simples facto de viajar? Não é isso que modera os prazeres, que refreia os desejos, que reprime a ira, que quebra os excessos das paixões eróticas, que, em suma, arranca os males que povoam a alma. Não faculta o discernimento nem dissipa o erro, apenas detém a atenção momentaneamente pelo atractivo da novidade, como a uma criança que pasma perante algo que nunca viu! Além disso, o contínuo movimento de um lado para o outro acentua a instabilidade (já de si considerável!) do espírito, tornando-o ainda mais inconstante e incapaz de se fixar. Os viajantes abandonam ainda com mais vontade os lugares que tanto desejavam visitar; atravessam-nos voando como aves, vão-se ainda mais depressa do que vieram. Viajar dá-nos a conhecer novas gentes, mostra-nos formações montanhosas desconhecidas, planícies habitualmente não visitadas, ou vales irrigados por nascentes inesgotáveis; proporciona-nos a observação de algum rio de características invulgares, como o Nilo extravasando com as cheias de Verão, o Tigre, que desaparece à nossa vista e faz debaixo de terra parte do seu curso, retomando mais longe o seu abundante caudal, ou ainda o Meandro, tema favorito das lucubrações dos poetas, contorcendo-se em incontáveis sinuosidades, fazendo incessantemente ainda mais um circuito antes de enfim descansar no leito de que se aproxima. Mas viajar não torna ninguém melhor de carácter nem mais são de espírito. Teremos de nos aplicar ao estudo, de frequentar os mestres da filosofia, a fim de assimilarmos os princípios já estabelecidos e investigar o que ainda está por descobrir. Só assim a alma se pode arrancar à mais dura servidão e alcançar a verdadeira liberdade. Enquanto ignorares a distinção entre o evitável e o desejável, o necessário e o supérfluo, o justo e o injusto, o moral e o imoral — nunca serás um viajante, mas apenas um ser à deriva.As tuas deambulações não te trarão qualquer proveito, já que viajas na companhia das tuas paixões, seguido sempre pelos males que te dominam. E bom era que estes males apenas te seguissem! Bom era que eles estivessem longe de ti! O que se passa, porém, é que os levas em cima, e não atrás de ti. Deste modo, onde quer que estejas, eles oprimem-te, destroem-te com a mesma virulência. Um doente precisa que se lhe indique um remédio, não um panorama. Se um homem parte uma perna ou faz uma entorse não vai pôr-se a passear de carro ou de barco: manda, sim, é chamar um médico que lhe ligue o membro partido ou ponha no seu lugar o osso deslocado. Ora bem: acaso pensas tu que uma alma quebrada ou torcida em tantos lugares pode tratar-se com uma simples mudança de ambiente? Não, esta doença é demasiado grave para curar-se com um passeio! A formação de um médico ou de um orador não se faz em viagem; a aprendizagem de qualquer arte não depende da geografia. Como pensar que a sabedoria, a mais importante das artes, se pode adquirir saltando daqui para acolá?! Podes crer que nenhuma viagem te põe ao abrigo do desejo, da ira, do medo; se tal fosse o caso, todo o género humano começaria em massa a viajar. Estes males não cessarão de atormentar-te, de desgastar-te ao longo das tuas viagens, terrestres ou marítimas, enquanto tiveres em ti as suas causas. Admiras-te que de nada valha fugir quando tens dentro de ti aquilo de que foges?
Séneca, in 'Cartas a Lucílio'

E é perturbador.
Keep walking, keep flying, always trying to run, when running is not a solution...

Insónia

E quando o sono não vem, viajo por aqui, entre o ruido do teclado e as cores do ecrã, encontrando no seu conjunto algo para ler, distraindo momentaneamente o meu pensamento.

"Uma sociedade inteira vive mergulhada num mundo de facilidades e aparências, afogada em sms, mails, blogues e redes sociais, onde procura criar uma estranha forma de vida e de relacionamento humano, que garante o contacto e o sucesso imediato e dispensa o incómodo que é enfrentar a vida real, sem ser a coberto do anonimato ou do disfarce hipócrita, e sem ter de assumir as consequências dos seus actos nem o vazio de passar por aqui sem ter feito nada de útil para os outros."
(Miguel Sousa Tavares)


Desisto... Volto à minha almofada... Ainda sem sono... Com mais pensamentos.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Vazio

De regresso à minha cama, sozinha, posso perder-me nos meus pensamentos. E os meus pensamentos conduzem-me a lugares distantes de mim.

O que não afasto também não deixo aproximar.
Pensam que sim...
Enganam-se.
Estou tão longe que já nem ouço o ruído das vossas vozes. Vejo-vos em "mute", como que em acordo com o vazio das vossas palavras. O que me assalta as memórias aparece assim em formato de filme mudo e a preto e branco, longe da coloração que tentam dar a situações simples, básicas e desnutridas de sentimentos.

domingo, 22 de março de 2009

Letras trocadas

A poucas milhas de casa perco-me no meio do ruido de vozes desconhecidas.
Neste pais estrangeiro ouço vozes na minha lingua, mas nem por isso mais familiares.
O teclado em que escrevo quebra a fluidez com que poderia escrever... Letras trocadas da ordem a que nos habituamos tiram-me o raciocinio, envolvem-me numa sensacao crescente de mulher perdida e baralhada...
Guardo so para mim o que penso, o que sinto. Remeto-me ao silencio verbal e escrito.
Ha dias assim.

sábado, 21 de março de 2009

Muitas Milhas

Voando por aí, colecciono milhas. Experiências. Conhecimentos mais ou menos importantes. Milhas de solidão partilhadas com caras desconhecidas. Um dia a dia superficial.
Em dia de meditação chego a conclusão nenhuma.

Apenas esta necessidade de escrever.